Não quero me autodenominar intelectual de carteirinha, mas é preciso paciência e alguma disposição para seguir viagem rumo ao Céu de Suely. Digo isso porque o público anda tão impaciente que pode ser difícil se interessar por um filme sem tiroteio, explosões ou piadas infames. O que dá ibope hoje é o lixo cinematográfico que muitos ousam chamar de arrasa quarteirão.
Se você faz parte dessa imensa massa de preguiçosos, então, esqueça e vá ver algo que combine mais com pipoca e coca cola.
Mas, se houver interesse em decifrar o enredo de Suely, sente-se e desfrute de uma das melhores produções de 2006.
Hermila (Hermila Guedes) volta à pequena cidade de Iguatu com seu filho no colo. O marido fica em São Paulo prometendo retornar assim que possível ao convívio de ambos.
Passam-se dias, semanas e Hermila percebe que foi abandonada a própria sorte. A avó e sua tia ajudam a cuidar do menino, mas as dificuldades financeiras não demoram a aparecer levando a moça a um permanente estado de pessimismo.
Diante da monotonia cearense, ela resolve fazer algo que causa espanto em na pequena comunidade: rifar o próprio corpo .
Daí surge o nome de Suely, usado para ocultar sua verdadeira identidade, o que mostra-se impossível, pois logo é criado um alvoroço entre os habitantes diante da incrível audácia.
Suely é expulsa de casa sofrendo as conseqüências de sua catastrófica decisão.
O diretor Karim Ainouz realizou um filme com a cara de uma região devastada pela seca sem parecer piegas ou preconceituoso.
O excelente elenco trabalha em perfeita sintonia assim como a belíssima fotografia de Walter Carvalho.
Apesar das agruras de todos os personagens, o céu sempre azul contrasta com todas as dores que cada um parece sofrer na carne.
O Céu de Suely prima por dar uma identidade a um Brasil há muito tempo largado a esmo pelos políticos.
A história da personagem torna-se a saga de muitas almas femininas presas a um modelo de passividade culturalmente enraizado. Hermila, opta por ser livre e seguir seu sonho mesmo que isso lhe custe a honra e a dignidade.
Solitária, corajosa, intrigante, passional. Ela carrega nas costas a coragem da mulher que jamais desiste, que enfrenta os sertões e luta para ser aceita com suas culpas e desejos, com a coragem no peito e muito sonho nos punhos.
O céu de Suely torna-se um dos marcos do cinema brasileiro ao ser despretensiosamente bem feito e por ter um enredo que apaixona quem não tem pressa.
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